quarta-feira, 20 de maio de 2020

Deixa a Vida Me Levar

20 de Maio de 2020.

Lá se vão quase 3 anos desde da minha última postagem nesse blog - eu tinha esquecido esse lugar assim como esqueci tantos outros, meus hobbies, minhas abstrações, minhas pequenas capacidades de sair voando pelo tempo-espaço.
Tudo isso foi sublimado ao longo desses anos por uma rotina rasteira ao chão, densa, meio pesada, o suficiente para me colocar no ápice da guerra. Guerra essa que é a vida real, da sobrevivência, da responsabilidade. Trabalho, responsabilidades, trabalho, renda financeira, trabalho, planilhas, sonhos profissionais, foco na conta bancária e na caça ao acúmulo de patrimônio para garantir uma velhice vindoura que nem sei se vai chegar. Tudo exageradamente trocado pelo prêmio de ter uma vida comum, sem muitas fantasias.
Não me entenda mal, eu vejo propósito demais no trabalho, nada me preenche mais, e está aí o grande problema...Só isso me preencheu em décadas.

Uma música aqui, alguns livros, um karaokê ali, uns porres acolá, e as ressacas foram o máximo do long-tail do que eu me lembrava ser uma certa indolência.

20 de Maio de 2020 e essa postagem vai ficar solta no Universo numa data erma no meio de uma situação inusitada, pra não dizer trágica: a pandemia da Covid19.

Em resumo, pegou o Mundo todo de pseudo-surpresa e congelou a vida, e a guerra, onde eu e tantos estavam inseridos. Sem trabalho, sem renda, sem as obrigações profissionais, sem gestão de pessoas, sem gestão de nada, no vácuo do que era tudo o que eu julgava primordial.

No início, após um mês de pandemia, em Abril quando me vi desempregada, entrei em desespero sobre todas as questões que pautavam minha existência: basicamente trabalho. Passei umas semanas na "bad", com medo de faltar algo e da doença, confusa e assustada, como acho que quase todos no planeta; e veio um vazio como se me cortassem um vício, como se tirassem minha droga e me jogassem numa cela.

Então Maio chegou, nem sei bem quando essa sensação de impotência passou dentre os dias livres e sem propósito, mas devagar me peguei vivendo sem a culpa de estar imersa num profundo e morno ostracismo, a cela virou rehab...
Eu até me cobrei do tipo "Faz alguma coisa, inventa a nova startup, manda seu CV, estuda, mantenha seu networking!", foi quando me lembrei que eu esquecia de fazer xixi e de beber água durante o dia no escritório.
Então me peguei tomando sol na laje, bebendo cerveja ao léu em plena quarta-feira de tarde. Acordei às 2 da tarde e nem liguei!
Comendo mil carboidratos, lendo os mesmos livros de décadas atrás, eu me joguei nesse limbo colorido, num Outono quente e cálido sem medo de ser vagabunda, imagino que até o Inverno passar.
Eu sou daquelas pessoas de sorte, sabe? No meu piloto-automático fui fazendo umas boas escolhas que me dão agora esse direito a uma janela de preguiça em meio a uma vida de incumbências e produtividade, só que por enquanto o mundo também parou, meses de descaso em meio a uma existência de sensatez. A Terra teve que parar pra eu parar com ela?

A pandemia agora me parece uma benção, um tapa na cara pra acordar pra vida, essa que é bem mais do que lucro e produção.

Não, eu sinto pelas pessoas que caem e padecem dessa virose, eu fico triste pelos que não tem a mesma sorte que eu, e justamente por isso me sinto ainda mais afortunada! Não sinto saudade das pessoas, eu sinto saudade da convivência, mas também tenho me sentido uma excelente companhia, e até nisso percebo o bônus.
Eu costurei, eu pintei, eu cozinhei, eu plantei, estou aqui nesse instante a escrever no meu blog, ando fazendo coisas simples que eu não fazia mais porque não tinha tempo ou porque me faltava energia após uma semana de agendas, obrigações, tratados e honradez, eu consigo me lembrar agora o que é ser uma criança novamente, sem horários, sem pesos, as horas para preencher com o que é lúdico e vaporoso.

São montes de SEM nesse texto e momento, e que dom é essa escassez de tanta vida adulta...

Certamente daqui até o fim dos meus dias essa pausa vai ter o seu valor, eu não quero mais me perder dessa Danie displicente tampouco da capacidade de me cobrar menos, de acumular menos, de sentir o poder e importância do que é fundamental.

E assim, até esse texto se prova o óbvio do benefício de uma vadiagem, deixando por hora a vida me levar...







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